pergunta é simples; a resposta, veremos. Existem boas razões para alguém crer em deus?

Não necessariamente a entidade monoteísta da tradição judaico-cristão-muçulmana. Que apesar de sua atual (e perigosa) influência, no contexto da cronologia terrestre é só um pingo no oceano.

Definitivamente não! Refiro-me a qualquer deus. Qualquer um que, de alguma forma, tenha sido alguma vez objeto de adoração e apelo humano.

Existem boas razões para se crer em qualquer um deles?

Não, eu não estou fazendo uma defesa do teísmo. Acho que eu já deixei bem claro em textos antigos minha posição sobre a existência de deus. Sou ateu convicto e assumido, para tristeza dos meus evangélicos pais.

Por outro lado, eu também não sou de fechar os olhos para as coisas que estão a minha frente. Aliás, eu devo meu ateísmo a essa postura. E para mim é inegável a clara incapacidade que as propostas não religiosas têm demonstrado em substituir os consolos que a religião proporciona. Como sinalizou bem o astrônomo (e também ateu) Marcelo Gleiser: Karl Marx disse a famosa frase: a religião é o ópio do povo. Se a intenção de alguns é tirar a religião das pessoas, é bom oferecer outro tipo de ópio.

Será que não estamos tentando tirar das pessoas, sem oferecer nada em troca, à única coisa que elas têm como porto seguro? Será justo tirarmos delas o ópio que, contraditoriamente, as mantêm sóbrias, e as deixarmos depois a sua própria sorte? Estou só perguntando.

Volto a minha pergunta inicial. Existem boas razões para alguém crer em deus? Você pode até achar que não, afinal a maioria de nós é ateu ou, pelo menos, agnóstico, mas existe sim. Olhe pela sua janela, ou ligue sua TV, e estará lá. A vida apresentando suas armas mortíferas.

Como já disse, eu não intento uma defesa da fé, ao contrário. E esse é o ponto onde eu quero chegar. O que eu pretendo aqui é, tão somente, abrir nossos olhos para a limitação do nosso ateísmo. Limitação das nossas respostas. Limitadas por que estão presas ao natural e ao material, e que, justamente por isso, nos faz trabalhar e viver apenas com aquilo que podemos conhecer. Limitação essa que pode ser suficiente para mentes como a minha e a sua, mas que certamente não é para a maioria da população mundial. Temos dificuldade em aceitar isso, mas precisamos. Até por que, esse limite é próprio do conhecimento científico e cético que tanto louvamos e desejamos ao mundo.

É verdade que nos últimos quatrocentos anos a humanidade fez avanços extraordinários. Avanços esses que já seriam capazes de suprir necessidades das quais, até então, só a fé dava conta. No entanto, se queremos (e acredito que queremos) um mundo sem superstições e sem os males da religião organizada, tornando a resposta para a minha pergunta uma negativa, precisamos oferecer as pessoas mais do que fórmulas e teorias cientificas. A menos que alguém me prove que entender como o universo funciona vá trazer alguma esperança aquele que acabou de perder um ente querido!

Talvez nosso erro seja subestimar o poder do argumento religioso. Desprezamos nosso adversário, e isso tem sido fatal. Essa é a resposta atual para a minha pergunta. Não é sem motivo que as pessoas acreditam em deus. E elas não deixarão de crer sem uma boa razão para isso. Sun Tzu afirmava que um dos segredos da vitória numa guerra é conhecer muito bem o inimigo e a si mesmo. Às vezes penso que não conhecemos nem uma coisa nem outra. Basta verificar como a maioria de nós prefere perder tempo (MUITO TEMPO) em chacotas no Facebook, falando de coisas sobre a fé das quais elas normalmente não tem a menor ideia, do que em pensar meios de salvar as pessoas de sua situação sub-humana, condição que, inevitavelmente, as levarão a acreditar nas palavras de charlatães que se dizem enviados de deus, e que prometem a cura de suas desgraças.

Desprezamos a teologia, e a mensagem que cresce a partir dela, porque esquecemos (ou simplesmente fingimos que não estamos vendo) de que, nesse exato momento em que você esta lendo esse artigo, pessoas inocente estão perdendo a cabeça por razões teológicas.

Mudo minhas perguntas agora. Será que os humanistas, ateus e céticos querem mesmo ver uma humanidade livre das amarras da superstição e do sobrenaturalismo? Será que temos a real noção do que significa um jovem de vinte e poucos anos abandonar sua família e se associar a um estado religioso que se especializou em cortar o pescoço de pessoas com facas de pão pelo pecado de zombar do seu profeta?

Será que conseguimos mesmo enxergar o perigo que ronda nosso país cada vez que um candidato cristão fundamentalista é eleito para compor a chamada bancada evangélica? Será que entendemos verdadeiramente que muitas pessoas creem em deus por que sentem uma sincera angustia diante da incapacidade humana de lidar com a insignificância da vida? Não tanto pelo fim dela, mas mais pelo porvir. De que elas têm um apavorante medo do que nos espera depois, e de que dizer simplesmente que não há depois não resolve muito para quem foi doutrinado deste muito cedo de que tudo na vida deve ter um propósito?

Para a primeira pergunta feita lá no topo, está evidente para mim a resposta. Para essas outras, diga-me você a resposta.

William de Oliveira

Formado em teologia, a mais de quinze anos, e que o levou ao ateísmo, humanista apaixonado, que acredita mais na dúvida sincera, do que na certeza imbecil. Atualmente membro da LiHS – Liga Humanista Secular do Brasil./>

FONTE: http://www.bulevoador.com.br/2015/03/existem-boas-razoes-para-se-crer-em-deus/